Rasteira na autoestima

14.9.15 by Fred Maia
Estava indo tudo muito bem. Bem de mais.

A evolução nos treinos era evidente, o pace melhorando, a resistência e a velocidade aumentando, os tempos em provas diminuindo, os números das calças e os dígitos da balança também. A cada nova missão cumprida, um levante na autoestima. Estava confiante que nada mais podia dar errado e os 42km seriam meus em breve. Mas aí veio o último longão..

34 Km. Eu tinha encarado com certa tranquilidade todos os desafios até ali. Com os 21km dominados, vieram os 24, 28, 30 e, por último, os fatídicos 34km.

A "barreira dos 30km" é conhecida por todos os atletas amadores e para sentir o drama, basta "dar um google" no termo citado para ver a quantidade de matérias na internet sobre os temidos 30km na maratona. Muitas matérias apontam 3 motivos principais para a barreira dos 30 ser tão temida: Falta de glicose no sangue, falta de glicogênio muscular e superaquecimento do organismo. Não sou perito no assunto mas desconfio que, por eliminação, o meu problema seja o segundo.



Há dois meses da prova me consultei com a Maria Julia, uma nutricionista especializada em esporte, indicada pela minha Assessoria de Corrida. Ela me passou um planejamento de alimentação diária, pré, intra e pós treino/prova. Eu sou um pouco desorganizado e, apesar de ter identificado a urgência em procurar um profissional da área para uma orientação adequada, demorei a fazê-lo e tenho dificuldade em seguir à risca o planejamento. Não tenho dúvida que é aí que o bicho tá pegando. O resultado é que eu vinha sentindo dores musculares sempre no finalzinho dos treinos longos mas no treino de 34km, feito no último sábado, 12/09, as dores começaram bem mais cedo.

Ter falhado no último longão me fez pirar durante e após o treino, afinal, a maratona é daqui a duas semanas!

Como o tempo estava frio e nublado no fim de semana, não me preocupei em sair tão cedo para correr. Me alimentei direito na véspera e tive uma boa noite de sono. A tensão "pré treino importante" para que tudo dê certo é normal e eu convivo bem com essa ansiedade. Como meus treinos até então haviam sido sempre melhores do que o esperado, eu estava confiante para os 34km. A Ludmila correu comigo os primeiros 14km (grávida de 5 meses!) e já no ponto em que nos despedimos eu sentia dores. Paçoca, mariola, gel de carboidrato e água intercalados a cada meia hora. Teoricamente tudo certo mas no km 16 precisei parar para alongar e ajustar o cadarço do tênis. Lá pelo km 18 percebi que havia esquecido as cápsulas de sal e aí as dores já haviam perturbado minha mente. Minha cabeça começou a minar meu corpo muito cedo. A insegurança começou a tomar conta de mim e por mais que eu conversasse comigo mesmo para tentar eliminar aqueles pensamentos da minha mente, as dores nas pernas não me deixavam sair daquilo. No km 24, ao chegar na Fortaleza de Santa Cruz, parei, sentei, comi uma mariola, apertei ainda mais o cadarço pois os pés doíam e eu achei que poderia evitar as bolhas apertando mais os tênis. Segui o caminho de volta para a praia de Icaraí, mais 10km. Com 26km parei de novo, comprei uma garrafa d'água para reabastecer a garrafinha e afrouxei os cadarços que a essa altura estrangulavam os meus pés. Caminhei quase dois km, desanimado e frustrado. Tentei correr de novo, não deu. Parei, afrouxei mais ainda os cadarços, que se fodam as bolhas, e perto do km 30 voltei a correr, devagar, pace de tartaruga. Deu certo, meu pé parou de me atrapalhar mas minha cabeça já havia me detonado. Foi difícil continuar correndo sem conseguir me livrar dos pensamentos na minha cabeça repetindo Você não vai conseguir correr os 42, Só faltam duas semanas para a prova, Você não tem outra chance de levantar a autoestima antes da prova, Se fudeu, Seu burro, etc.

Acabei os 34km em quase 4 horas, triste, derrotado.

Subir as escadas para chegar em casa foi quase tão difícil quanto o treino. Tomei um banho quente e me escondi debaixo das cobertas, me sentindo minúsculo e adormeci.

Acordei com fome, o que me ajudou a levantar e seguir em frente. Saí com a Lud para almoçar e conversamos sobre o treino. Depois de muito papo/terapia, ela me fez acreditar que foi muito melhor ter tido a experiência de "quebrar" no treino do que no grande dia, mesmo a duas semanas da prova.

Agora é seguir o planejamento da reta final dos treinos. Já corri tudo que tinha pra correr antes da maratona, então só me resta cuidar do corpo com a alimentação adequada e trabalhar minha mente para que ela não seja um desafio maior do que os 42km.

Vambora que tá chegando a hora!


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